Por Darren Naish
Tradução de Gabriela Sartori Mingatos
Um dos mamíferos pleistocênicos retratados sem dúvida em livros populares e enciclopédias de pré-história é o Rinoceronte Lanoso Coelodonta antiquitantis (o nome da espécie é escrito antiquus em muitas publicações). Originalmente nomeado em 1807 (mas já era conhecido anteriormente), este, adaptado ao frio, peludo rinocerontideo percorreu desde as costas da Europa, o leste da Beringia, o sul do Caucasus e o sudeste da China. Por que ele nunca chegou ao norte da América ninguém sabe.
Assim como inúmeros megamamiferos da Era do gelo, o rinoceronte lanoso não foi necessariamente um habitante de locais frios e congelantes, com nevascas e neve espessa ou em habitats dominados por tundras. Espécies espanholas vieram de ambientes secos e temperados dominados por gramíneas e árvores latifoliadas.
Fosseis de outro Coelodonta mostra que esse grupo se originou nas regiões tibetanas durante o plioceno, sua evolução pode ter sido ocasionada pela elevação do planalto de Qinghai – Tibet (Deng 2002, Deng et al. 2011). C. thibetana originário do Tibet é o mais velho membro do grupo. Anteriormente a espécie mais antiga de Coelodonta era uma animal comumente chamado de C. nihowanensis. Argumenta-se que esse nome não seria apropriado como um nomen nundum ( um nome sem um tipo de espécie).
Um rinoceronte do médio pleistoceno, C. tologoijensis, conhecido em Transbaikalia, Mongolia e provavelmente sudoete da Siberia. Essas velhas espécies são menores que C. antiquitatis e possuem membros mais delgados (Kahlke & Lacombat 2008).
Fragmentos de plantas presos nos dentes do rinoceronte lanoso (mais comumente, dentro do infundíbulo – o recesso presente entre os molares) mostra que eles eram herbívoros, 96% ou mais da dieta deles era baseada no consumo de gramíneas, com musgos e flores herbáceas (Guthrie 1990). Contudo resíduos estomacais preservados mostram que o rinoceronte lanoso também se alimentava de salgueiro anões e bétulas.
A forma com que o crânio e os dentes desse rinoceronte lanoso está de acordo com um modo de vida herbívora: a boca e os lábios são amplos, e a cabeça inclinada para baixo, mesmo quando o animal está na posição relaxada.
O crânio é particular por ter tanto um extenso septo nasal ossificado e a região da pré maxila virada para baixo em contato com a borda da maxila superior. Como consequência, tem encerramento ósseo das narinas revertido, uma característica de mamíferos ancestrais, mas não comum nos mamíferos em si.
A região do focinho também é incomum e os incisos são totalmente ausentes em ambas maxilas.
Isso é presumivelmente uma extrema especialização para uma vida de pastoreio e levante a questão se o Coelodonta teve almofadas queratinosas ou alguma outra estrutura similar nessas partes da maxila.
Como o Coelodonta aparece nas populares representações? Artistas tem usualmente mostrado que se parece com um moderno branco e preto rinoceronte vestido com um casaco marrom peludo. Eu nunca fiquei satisfeito com esses tipos de reconstruções desde que eles ignoram as varias nuances da anatomia do rinoceronte lanoso, algumas têm sido obvias desde 1870.
Como uma criança de 10 anos ou mais, eu me recordo de uma das mais memoráveis espécies do Museu de história natural de Londres que foi sua coleção de múmias polacas de Starunia preservadas em um escoo petroquímico e descobertas em 1929 (Nowak et al. 1930). A coleção em Londres, usada para ser parte de uma exposição de mamíferos fosseis, tão perto que você pode toca-la. A coleção permanece em exposição no MHN hoje, mas isso se encontra aninhado perto da entrado do museu. Você não pode se aproximar e eu duvido que qualquer um que não seja um paleozoologo “hard core” ou um nerd saberá o que é.
O QUE OS ANTIGOS RETRATAVAM?
Rinocerontes lanosos não são retratados com tanta frequência em pinturas paleolíticas. Elas são massivamente ilustradas por mamutes, bisons e cavalos (Guthrie 2005). De fato, até recentemente, só 20 imagens de rinocerontes lanosos são conhecidas (um numero menor de representações portáteis de Coelodonta também conhecidas) ( Bahn & Vertut 1997).
Contudo esse numero é bem mais que o dobro depois da magnifica descoberta da gruta de Chauvet na França, onde tem mais ou menos 60 imagens de rinocerontes.
A arte pré-histórica frequentemente mostra a cabeça do rinoceronte inclinada para baixo como sugerido pela anatomia. A maior parte das representações mostram que o rinoceronte tinha dois chifres: o posterior ( ou frontal) é as vezes mostrado como pequeno, ou muito mais pequeno que o anterior (ou nasal) mas as vezes os dois tem o mesmo tamanho, e as vezes (como na caverna de Les Combarelles, Dordogne) o chifre posterior se mostra levemente mais longo que o anterior. Como discutido acima, chifre preservados mostram que os rinocerontes tiveram proporções variáveis de chifres. É claro, a possibilidade existe de que algumas pinturas rupestres sejam inexatas- nós sabemos que os antigos artistas foram frequentemente brilhantes e fielmente precisos ilustradores dos animais que eles viam, mas eles foram praticamente fazendo as coisas de memória e cometendo enganos.
Todas as imagens do rinoceronte lanoso consistem em mostrar uma profunda e enorme corcunda no ombro que se extende para frente e para atrás da cabeça. A corcova é tão grande que quando o animal é retratado pastando, a borda anterior da corcova as vezes é mostrada pendendo praticamente por toda a face. O comprimento do membro e o quanto o corpo está próximo ao chão varia. Algumas ilustrações mostram os membros como sendo proporcionalmente pequenos, a barriga estando quase em contato com o chão, e uma longa franja de pelos desgrenhados ao longo da superfície ventral da barriga. A maioria, contudo, não mostra isso, e em vez disso, a barriga está mais para cima e sem franjas.
Talvez o “casaco” seja variável conforme as estações.
Sobre as cores? Chegaremos nisso num minuto.
MAIS SOBRE CHIFRES: Pequeno e robusto vs. Longo e achatado.
Como já notado, nós sabemos um pouco sobre a morfologia de chifres desse animal, ambas as pinturas rupestres e alguns maravilhosos espécimes de clima frio vindos da Sibéria mostram que o Coelodonta tinha chifres gêmeos, com um gigante, gentilmente curvado chifre nasal e um frequentemente pequeno ou mais delgado. (Fortelus 1983 Shidlovskiy et al. 2011)
Somente dois espécimes possuem ambos os chifre em posição, mas um grande numero de chifres isolados é conhecido. Somente sete ou mais ou menos isso foram relatados antes de 1990, mas nós sabemos de mais de 40 chifres que variam em formato e tamanho.
Os chifre eram pensados originalmente como sendo pinças separadas de pássaros gigantes, em particular os míticos super pássaros siberianos que lutavam com monstros marinhos e peixes gigantes (Fortelus 1983).
O chifre posterior é frequentemente pequeno, atarracado e sub circular em sua seção transversal, com uma forte ponta. O chifre anterior é normalmente muito mais longo (4x mais longo), mas isso não é uma estrutura subconical, arredondado na secção transversal como o chifre anterior dos rinocerontes vivos. Mas, é lateralmente comprido, lenticular na secção transversal e com um formato triangular na borda anterior. Esse corte transversal foi aparentemente produzido com as facetas de desgaste que se formaram ao longo dos lados da borda principal (Fortelius 1983)
O chifre é de fato tão achatado de lado a lado que tem sido descrito as vezes como prancha: durante os anos de 1760, naturalista e explorador Peter Simon Pallas propôs que a forma achatada era artificialmente causada pelo homem cortando material dos lados, mas isso está incorreto. A errônea ideia de que a forma achatada era resultado de distorções pós mortem tem sido também debatida. Alguns autores tem sugerido também que o chifre anterior deve ter sido muito frágil para ser usado em brigas (embora intuitivamente razoável, a intuição oferece erros nesse aspecto), e a inevitável ideia que era usada para raspar a neve de lado tem sido bastante popular.
Regularmente espaçadas, fitas escuras ao longo do chifre (espaçadamente próximas na base, mas separadas nas pontas) são presumidamente visíveis em vida. Isso tem sido pensado como faixas de crescimento, que nesse caso mostram o que o rinoceronte lanoso viveu ao longo de 30 anos, em tempo de vida similar as dos rinocerontes modernos. Contudo, Shidlovskiy et al. (2011) notou que as faixas escuras desse tipo podem estar relacionadas com a taxa de deposição de melanina e pode não ser anual.
Os chifre anteriores tem sido encontrados variando em proporção e detalhe. Alguns são longos e mais delgados que outros, e tem uma ponta sem corte. Isso tem inferido com base em comparações com rinocerontes vivos que são mais finos em femeas (Guthrie 1990). Contudo Fortelius (1983) pensou que era mais provável que o rinoceronte lanoso reproduzisse estratégias de reprodução que tem se baseado em torno de um curto, intenso período de cio e isso pode ter levado a evolução de um corpo e chifres grandes em machos. Os chifres dos modernos rinocerontes são usados em intra específicos combates e brigas com predadores, mas também no forrageamento e especialmente em quebrar ramos. De fato, isso tem sido sugerido porque a elaboração do chifre na evolução dos rinocerontes os levou ao uso nos forrageamentos, uma intrigante hipótese que precisa de mais estudo.
PADRÕES DE PIGMENTAÇÃO
O que nós sabemos sobre pigmentação em rinocerontes lanosos?
Graças as pinturas rupestres nós temos uma excelente, detalhada e aparentemente bem acurada informação sobre a aparência em vida de alguns animais pleistocênicos. As vezes, essas informações confirmam o que nós suspeitávamos, mas em outras ocasiões, a arte antiga nos surpreende. Representação pre históricas do cervo gigante Megaloceros e algumas renas antigas, cavalos e leopardos, por exemplo, mostram que esses animais não se parecem com a maioria das reconstruções.
Representações do Coelodonta nas pinturas rupestres europeias mostram com uma escura grossa faixa próximo ao preta no meio do corpo do animal. A faixa é representada com cuidado “ as vezes gravada nas bordas e cheia no preenchimento” (Bahn & vertut 1997, p. 153)
A largura dessa faixa é variável. Em algumas imagens são estreitas e parecidas com cintos e restrita a parte central do corpo ou a região anterior da pélvis. Em outras é enorme, se estendendo por por todo o corpo dos quadris aos ombros.
Explanações sugerem que essa faixa inclui o que pode representar dobras verticais na pele e uma interpretação, em tom de gozação, que poder ser uma sela também foi feita.
Enquanto a ideia de que a faixa seja simbólica possa ser plausível, parece razoável concluir que isso era uma característica genuinamente anatômica: isto é, que esses rinocerontes tinham uma faixa de pigmentação muito escura, quase negra envolvendo o meio dos seus corpos. O fato que as faixas são apenas presentes nas pinturas do oeste da Europa pode (Guthrie 2005) sugerir, mostrando que era uma única população (subespécies) de rinocerontes lanosos presentes.
Subespécies do C. antiquitatis tem por acaso, o que vem sendo chamado de: um espécime do médio pleistoceno vindo da França que foi considerada como o tipo de um novo táxon C.a. praecursor. Como o asiático C. tologoijensis e outros mais arcaicos Coelodonta que tem proporcionalmente um crânio maior, orbitas localizadas mais anteriormente e arcos zigomáticos mais curvados do que o clássico rinoceronte lanoso do pleistoceno inferior. Contudo, Kahkle & Lacombat (2008) removeram C. a. praecursor do c. antiquitatis e o colocaram junto ao C. togoijensis.
As faixas transversais escuras tem um precedente no mundo vivo, mas elas são raras e não posso pensar em nenhum exemplo que se pareça com a reconstrução do Coelodonta. Por essa razão, um pouco de ceticismo é bom. Guthrie (2005) aponta para animais vivos que tenham esses tipos de estruturas (incluindo bois e porquinhos da índia) mas muitos são domesticados e portanto não submetidos as pressões da seleção natural.
Ele também apontou o gigante panda Ailuropa melanoleuca e Tanuki Nyctereutes procyonoides como exemplos: entretanto, em ambos os casos as faixas eram incompletas ou restritas aos ombros, não no meio do corpo.
O QUE MAIS SABEMOS?
O que mais sabemos sobre a visa e a aparência de um rinoceronte? O couro do rinoceronte lanoso era longo, consistindo em mechas finas e grossas de pelo escuro. A pele (preservada no caso das carcaças de Starunia) é coberta com pequenas e abundantes protuberâncias (Nowak et al. 1930).
Os folículos variam de tamanho de acordo com fios que são suportados, como os das costas e pescoço que são mais largos: um fato consistente com a presença de uma juba. Três ou quatro saliências formadas na pele e gordo- nem tudo corresponde com a espinha neural subjacente – são presentes no meio do pescoço e ombros, como são em rinocerontes vivos.
Os lábios são largos, vagamente retangulares (com cantos anterolaterais arredondados) assim, novamente, algo parecido com rinocerontes viventes. O lábio superior parece se estender sobre o inferior em alguns espécimes parece ter alta mobilidade, embora tenha alguma contenção como tão longe o lábio superior se estende anteriormente. Alguns autores tem argumentado que a sobreposição do inferior nem sempre é proeminente, talvez remeta ao Moose Alces alces (tem um artigo de 1924, creio eu, de Hilzheimer, mas não encontrei a citação). Outros têm contestado isso, afirmando que ao invés disso que os lábios simplesmente são bem juntos (Nowak et al. 1930).
Espécimes mumificadas revelam que a cauda é proporcionalmente curta como é previsto em mamíferos adaptados ao frio. A cauda é também achatada, nua na parte ventral, na distal só a metade, e longos pelos nas pontas e nas bordas. As orelhas são mais estreitas que a dos rinocerontes vivos – tem sido descritas como forma lanceolada. A ideia mencionada acima de que rinocerontes lanosos não poderiam brigar com seus chifres é refutada pelas pinturas nas cavernas que claramente mostram animais brigando. Chernova & Kirillova (2010) olharam para os chifres interno micro anatomicamente e concluíram que os chifres eram resistentes para serem fraturados. A incomum ossificação nasal pode ser explicada pelo vigoroso uso do chifre anterior em combate ( Shidlovskiy et al. 2011).
Guthrie (2005) notou que algumas imagens de rinocerontes nas cavernas mostram espinhos e flechas embutidas no corpo (um punhado de). Isso pode indicar que os rinocerontes eram raramente caçados. Com numerosos cavalos, cervos e bisões ao redor, nós podemos dizer que aquelas pessoas raramente caçavam esses gigantes, formidáveis casca grossa. Um rinoceronte em Chauvet parece mostrar sangue jorrando de sua boca e nariz enquanto um em Colomière pare ter varias flechas projetadas na barriga. Alguns outros exemplos franceses parecem ter espetos fincados ao lado do corpo (Guthrie 2005).
No geral, nós claramente sabemos muitos detalhes sobre o surgimento desse animal e artistas que escolheram representa-los incorporando esses inúmeros detalhes. Muitas vezes, ele não tem: você pode ver um chifre inexato e lábios reconstruídos de inúmeras maneiras, muitas não incorporando detalhes da pigmentação, a faixa escura em especifico. E eu fico frustrado com paleontólogos que são pagos para dar consultoria a artistas paleontológicos mas não sabem ou melhor – não se importam sobre pensar corretamente.
Aqui está um rinoceronte lanoso, um compilado com a combinação de tudo que sabemos…
Eu realmente deveria escrever sobre a aparência de outro mamífero pleistocênico em algum momento. E um dia irei!
Fonte: Scientific American