Encontrei um artefato ou sítio arqueológico. E agora? O que fazer?

Texto: JuCa
Revisão: Dani Ortega

Exemplares
Artefatos de pedra lascada e polida. Tratam-se de réplicas produzidas por um arqueólogo através de atividades experimentais. Crédito: JuCa.

Para muitas pessoas, encontrar um artefato, ou um sítio arqueológico, é um grande sonho. Até mesmo os arqueólogos sonham em encontrar tipos específicos de artefatos e sítios. E as vezes alguma outra pessoa, mesmo que por acidente, tem a grande sorte de encontrar alguma coisa arqueológica. Quando os arqueólogos encontram algum material, ou um sítio, eles sabem muito bem o que fazer, e como agir dentro das diretrizes éticas e legalmente estabelecidas em seus países (independente se o sítios e os artefatos serão pesquisados depois). Mas e se você não é um arqueólogo e achou um artefato ou um sítio? Você sabe o que fazer? Não? Então aqui vão algumas perguntas e respostas para te ajudar a registrar a sua importante descoberta arqueológica.

“Posso  levar os artefatos pra casa?”

O erro mais comum (que TODO MUNDO comete, infelizmente) ao ver um objeto arqueológico é correr pra tirar ele de seja lá onde ele esteja. Talvez ele esteja na superfície do chão, dentro de uma trincheira recentemente escavada por uma máquina, ou talvez parcialmente enterrada em algum lugar. É ÓBVIO que a gente vai querer pegar esse artefato e olhar detalhadamente pra tentar entender o que ele é, como ele foi feito, quantos anos ele tem, etc… Mas essa tentativa de saciar nossa curiosidade acaba apenas por atrapalhar a busca por essas informações. Afinal, para que arqueólogos e arqueólogas possam responder essas questões é necessário que o artefato ainda esteja no mesmo local onde ele foi encontrado. A localização exata de objetos é uma das informações mais importantes para saber a idade deles, por exemplo.

“Mas e se for só uma pedrinha sem importância?”

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Exemplo de lâmina de machado polida pré-histórica encontrada há vários metros de distância de um sítio arqueológico. Muitas pessoas poderiam achar que é uma simples pedra no meio do mato. Crédito: JuCa.

Tudo em um sítio arqueológico tem importância para os arqueólogos! TUDO! E acredite, não estou exagerando. Até mesmo aquela pedrinha pequena e feia perto dos artefatos bonitos pode ser um objeto de grande importância. Muitas pessoas olham para fragmentos de machados polidos, pontas de flecha, ou até mesmo cacos de vasilhames cerâmicos pré-históricos e acham que “é só uma pedra”. Da mesma forma, tem muita gente por aí coletando “pedrinhas bonitas” ou “diferentes” e achando que são artefatos arqueológicos. Logo, é sempre melhor deixar que um arqueólogo ou uma arqueóloga análise o local e os objetos.

Ou seja, NUNCA retire os artefatos do local onde você os encontrou. Assim você estará ajudando na arqueologia muito mais do que levando os objetos para casa ou a um museu.

“Mas e se o local onde eu encontrei os artefatos ou sítios está prestes a ser destruído?”

Do lado esquerdo, uma Pirâmide Maya preservada. Do lado direito, antiga pirâmide de Nohmul (uma das maiores pirâmides Mayas que já existiu e datada em mais de 2 mil anos) destruído por uma empresa, a qual tentou utilizar as pedras moída da pirâmide na construção de uma rodovia. Crédito: The Huffington Post.

Pois é… sabemos muito bem que muitas empresas, como construtoras e mineradoras frequentemente destroem o patrimônio arqueológico, ilegalmente, e muito do no nosso conhecimento sobre a humanidade se perde devido a estes grupos que priorizam muito mais o lucro pessoal do que a produção de conhecimento científico e cultural. Inclusive, aqui no Brasil muitas construtoras destruíram sambaquis com mais de 20 metros de altura e usaram o material destruído como material de construção em condomínios no litoral. A propósito, Sambaquis são sítios arqueológicos que existem no litoral brasileiro, alguns deles gigantescos, e neles são encontrados diversos tipos de artefatos de osso, pedra polida, estatuetas com formas de animais e até mesmo diversos sepultamentos humanos pré-históricos.

De acordo com a legislação de muito países (incluindo o Brasil atualmente), todo local que será destruído ou modificado por essas empresas deve, obrigatoriamente, ser estudado através de uma pesquisa arqueológica. Esses estudos já salvaram centenas de sítios arqueológicos no Brasil nos últimos 30 anos. Mas é claro que muitas empresas ignoram estas leis, mesmo sabendo que podem ter problemas sérios legalmente. Frente a esses atos criminosos muitas pessoas acreditam que o mais correto é coletar todo o material possível urgentemente e levar para algum profissional que trabalhe com arqueologia, ou para algum museu.

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Casarão do século XIX tombado pela prefeitura em Jataí (GO), que foi posteriormente destombado e demolido durante uma madrugada de sábado para domingo, sem o aviso ou consentimento da comunidade, revoltada pela destruição de um lugar importante de memória. A ação parece ter sido impulsionada por motivos econômicos sobre o terreno, bem situado no centro comercial da cidade. Crédito: O PopularGazeta Popular Online

Por mais louvável e cheia de boas intenções que seja esta atitude, a melhor opção ainda é entrar em contato com algum arqueólogo ou arqueóloga antes de sair coletando artefatos, ou você pode até mesmo fazer uma denúncia diretamente para o Centro Nacional de Arqueologia, um subdepartamento do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Assim, essa destruição pode ser interrompida e o local poderá ser, finalmente, estudado por grupos de pesquisadores qualificados.

Para falar com o Centro Nacional de Arqueologia você pode usar este e-mail: cna@iphan.gov.br

O mesmo vale para sítios arqueológicos onde não existem artefatos espalhados, mas “apenas” paredões, lajedos, ou blocos rochosos com pinturas e gravuras rupestres que são alvos de depredação (tipo aquelas em que as pessoas escrevem seus nomes ao lado ou em cima das representações rupestres). Isso é muito comum, na verdade. Mesmo que você já tenha removido os artefatos do local onde foram encontrados, não tem problema. Você não será acusado de destruir o patrimônio arqueológico. Afinal, você não sabia que tirar os objetos do local era proibido, e só tinha a melhor das intenções, não é mesmo? Nesse caso, apenas contate um profissional em arqueologia. Mas agora você já sabe né? Nada de sair coletando artefatos arqueológicos por aí! E se você tiver artefatos em casa, cuide muito bem deles!!! Você não está usando um artefato arqueológico para segurar a porta da sua sala, né?

“Mas eu nunca soube disso, e inclusive tenho alguns artefatos em casa” ou “Não tenho certeza se o que eu achei é algo arqueológico”

Contate alguém mesmo que você não tenha certeza se o que você encontrou é ou não é um artefato arqueológico. Mas não apenas diga que você achou algo. Forneça o maior número de informações possíveis. Fotos dos objetos e do local ajudam pra caramba. Os arqueólogos verificarão se o que você encontrou é realmente um artefato ou sítio arqueológico, e então verificarão se o local já foi anteriormente registrado e estudado OU se é uma nova descoberta. Dependendo do que foi encontrado, arqueólogas e arqueólogos poderão ter um interesse muito grande, e você poderá inclusive os auxiliar em visitas ao local de sua descoberta. E aí você pode falar, oficialmente, que você foi o responsável por uma importante descoberta arqueológica. Legal né?

“Mas eu não conheço nenhum arqueólogo, na minha cidade não tem”

Sim, esse é um problema muito comum no Brasil. Existem poucos profissionais dessa área no nosso país. E também são poucos os museus arqueológicos brasileiros. Você pode entrar em contato com o museu arqueológico mais próximo da sua cidade, ou pode até mesmo enviar um e-mail aqui pro nosso site e nós te ajudaremos.

Nosso e-mail: arqueologiaeprehistoria@gmail.com

Lista de museus arqueológicos no Brasil: Museus de Arqueologia no Brasil

“Eu tenho medo que o arqueólogos tirem de mim o material que EU encontrei”

É compreensível. Afinal, sempre temos essa falsa noção de que tudo que a gente encontra é nosso. Mas isso não é bem verdade. E também não é verdade que os arqueólogos vão tirar de você os artefatos encontrados. Tudo que os pesquisadores desejam é estudar e preservar  os achados da melhor maneira possível. Por isso, os pesquisadores evitarão todo e qualquer tipo de conflito com você. Eles só querem a sua ajuda! Inclusive algumas das pesquisas arqueológicas mais importantes do Brasil foram feitas apenas com artefatos guardados em casas de diversas pessoas (muitos deles acabaram sendo doados aos museus e expostos para toda a população).

Algo que todos devemos entender é que os artefatos arqueológicos nos ajudam a entender melhor a humanidade através de toda a sua história e pré-história. Dada sua extrema importância, as leis de diversos países, incluindo o Brasil, definem os achados arqueológicos como patrimônio público. Ou seja, em teoria, os artefatos arqueológicos não pertencem a nenhuma pessoa ou instituição, independente de quem tenha encontrado esses materiais ou de quem cuide deles. Os artefatos arqueológicos, assim como os sítios, são PÚBLICOS. Afinal, todas as pessoas do mundo têm o direito de saber mais sobre a história da humanidade tanto quanto você. E um dos objetivos das pesquisas científicas é tornar esse conhecimento disponível a todos! E para tornar esse conhecimento disponível a todos, também é necessário que os artefatos sejam guardados em locais que muitas pessoas possam ter acesso e que ao mesmo tempo permita que estes objetos sejam preservados da melhor maneira possível.

Ou seja, além de informar os arqueólogos sobre sua descoberta, considere doar os artefatos arqueológicos que você encontrou ou que você possui em sua casa para um museu. Dê preferência aos museus mais próximos do local da descoberta. Se não existirem museus próximos, considere doar para alguns dos museus localizados no seu estado. Mas caso você ainda ache que é mais seguro manter os artefatos em sua casa, permita que as arqueólogas e arqueólogos estudem os artefatos que você encontrou em sua casa. A nossa maior preocupação é estudar estes objetos para aprender mais sobre a humanidade.

“Mas se os artefatos e sítios arqueológicos são públicos, quer dizer que eles não têm valor?”

Se você estiver pensando em valor monetário, dinheiro, realmente não têm. Artefatos arqueológicos não valem nem um real sequer. Legalmente, nem mesmo uma múmia egípcia cheia de enfeites de ouro puro não vale um centavo. Na verdade, a venda e compra de materiais arqueológicos é considerado crime sério em todo mundo. O tráfico de materiais arqueológicos é o 3º maior do mundo (atrás apenas do tráfico de armas e drogas). A lei brasileira pune o tráfico arqueológico severamente, com multas e até mesmo prisão. Tentativas de venda destes materiais na internet são feitas em sites de venda e compra de produtos, e os casos de denuncia e punição tem aumentado nos últimos anos. Portanto, não venda os artefatos que você encontrou para ninguém! Nem sequer considere comprar, pois, você estará incentivando o crime e a perda de um importante conhecimento científico para a humanidade. Se você souber de alguma pessoa ou entidade que esteja vendendo materiais arqueológicos, seja nas ruas ou na internet, denuncie!! As denúncias podem ser feitas ao IPHAN e à Polícia Federal.

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Réplicas legítimas de pontas de lança e bifaces (machados de mão) do Paleolítico produzidos através das mesmas técnicas da pré-história. Crédito: JuCa

Mas se você gostaria muito, mas muito mesmo, de ter objetos arqueológicos em sua casa, considere comprar réplicas legitimas, e não artefatos arqueológicos de verdade. Existem alguns sites da internet que são especializados na produção de réplicas de artefatos arqueológicos comuns até réplicas de artefatos importantes do mundo todo. Alguns são cópias idênticas feitas em resina, e outros são produzidos utilizando os mesmos materiais e técnicas da pré-história. Você vai pagar muito mais barato comprando uma réplica legítima do que comprando um artefato original de um traficante, além de não correr o risco de ser multado ou preso. Além disso, a não ser que você seja um especialista em artefatos arqueológicos, você não saberá se o artefato que o traficante está lhe vendendo é de fato uma peça arqueológica, ou uma réplica moderna. Logo, sempre é preferível comprar uma peça que é legitimamente uma réplica.

E aí? Você tem mais alguma dúvida sobre o que fazer ao encontrar um artefato ou um sítio arqueológico? Pergunte pra gente!