Cinco Motivos Para Você Não Comprar Aquele Artefato Antigo

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Funcionários do Museu Damascus envolvem artefatos arqueológicos dentro de caixas para os proteger de serem danificados no dia 24 de março de 2015, na capital da Síria. Trabalhadores do Museu Nacional de Damascus da Síria cuidadosamente embalaram estátuas e as colocaram em caixas para serem transportadas a um local seguro, na esperança de salvar as peças inestimáveis de roubo ou destruição. Desde a sua nomeação em 2012 como chefe de antiguidades em meio à guerra civil na Síria, Maamoun Abdulkarim afirma que tem em mente apenas uma coisa — evitar uma repetição do tipo de pilhagem que devastou o patrimônio do Iraque após a invasão de 2003. AFP PHOTO / JOSEPH EID (Photo credit should read JOSEPH EID/AFP/Getty Images).

Por Kristina Killgrove

Como arqueóloga que trabalha na Itália, eu geralmente sou contactada algumas vezes ao ano por pessoas querendo saber se um artefato que elas compraram nas férias em algum lugar na Europa é autêntico. Seguramente um especialista em cultura romana pode dar informações detalhadas sobre um pote ou uma estatueta, descobrir se é autêntica e estimar o seu valor, certo? Na verdade não é bem assim. Arqueólogos profissionais são ligados à códigos de ética. As duas organizações nacionais às quais eu pertenço, a Society For American Archaeology e o Archaeological Institute of America, ambos incitam os arqueólogos a evitarem “atividades que realcem o valor comercial” de objetos arqueológicos. Nós não estamos e não deveríamos estar no ramo de se avaliar atiguidades, e minhas respostas à esses questionamentos envolvem tentar educar essas pessoas com relação aos motivos por trás dessa ética.

Então por que você não deveria comprar aquele artefato antigo nas férias? Isso não tem nada a ver com a “maldição da múmia”, e tudo a ver com questões legais, científicas e éticas. Muitas pessoas pensam que não há mal nenhum em se coletar uma peça do passado, e que elas estão investindo em história, mas aqui está o porquê de elas estarem erradas:

1. O objeto é provavelmente uma falsificação. Artefatos falsos têm um longo histórico ao redor do mundo, assim como os antigos romanos copiavam estátuas gregas originais, há muitas chances de que o pote ou estátua que você encontra em uma pequena cidade em um país estrangeiro tenham sido produzidas para o mercado de turistas. Alguns países, como Israel, possuem leis que ordenam que os vendedores mencionem especificamente quando algo é uma réplica, mas essas leis não são sempre seguidas.

2. Se não é uma falsificação, pode ser ilegal. Comprar e trazer antiguidades para o seu país pode ser ilegal. Em 1970, a UNESCO escreveu uma convenção sobre bens culturais. Os países que a adotaram — agora totalizando 128 — foram obrigados a criar diretrizes para o patrimônio cultural e leis para impedir a importação e exportação ilícitas de objetos antigos. Esses regulamentos foram postos em prática em diferentes momentos por diferentes países, mas o ano de 1970 foi um marco porque a Association of Art Museum Director adotou amplamente diretrizes para a aquisição de material arqueológico e arte antiga.

3. Esse comércio ajuda a alimentar conflitos e guerras internacionais. Em conflitos atuais na Síria, Egito e Iraque, sítios arqueológicos são campos de batalha e grupos terroristas radicais incluem as vendas de antiguidades em suas fontes de recursos. Isso cria difíceis dilemas éticos para os arqueólogos, que têm uma dupla obrigação em proteger o patrimônio cultural e ao mesmo tempo pôr de lado a história antiga para ajudar as pessoas de hoje. Pela força de sua existência, o lucrativo mercado de antiguidades é um meio para conflitos envolvendo a danificação, destruição, ou recolhimento de objetos antigos e sítios.

4. Ele pode ter sido obtido por meio de saques a sítios arqueológicos, o que destrói a nossa capacidade de compreender o passado. Assim que os artefatos são retirados do solo, o seu contexto específico desaparece. Os arqueólogos registram todas as informações possíveis — não somente com relação ao aspecto do artefato, mas a sua relação com os demais vestígios, pessoas e edificações — com técnicas cada vez mais sofisticadas. Motivados normalmente pelo desejo de se conseguir dinheiro com a venda dos artefatos recém encontrados, muitos saqueadores invadem áreas de acondicionamento de artefatos, e pior ainda, cavando ao acaso no chão em sítios arqueológicos. Os saqueadores nos impedem de compreender o passado, destruindo o contexto arqueológicos dos artefatos.

5. Provavelmente não pode ser doado a um museu. Indiana Jones nos ensinou que artefatos pertencem a museus, e alguns colecionadores obtêm benefícios por doarem os seus itens. Mas desde a convenção de 1970 da UNESCO, os museus têm reforçado as suas recomendações com relação a o que eles podem e não podem aceitar. O museu J. Paul Getty é o mais acusado de obtenção de objetos sem notas fiscais. Mês passado, vários itens foram devolvidos à Itália, de coleções públicas e privadas de todos os Estados Unidos, tendo sido milhares de itens repatriados na última década. Se um artefato não possui um histórico impecável, um museu não irá tocá-lo.

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Alguns dos 11 caixões antigos contendo ossos de judeus do período do Segundo Templo estão sendo verificados após terem sido recuperados de ladrões em 31 de março de 2014, no museu Rockefeller em Jerusalém. Policiais e inspetores de antiguidades prenderam uma quadrilha acusada de saquear os antigos ossuários judaicos de uma caverna na região de Jerusalém, afirma a Autoridade de Antiguidades de Israel (IAA). AFP PHOTO/GALI TIBBON (Photo credit should read GALI TIBBON/AFP/Getty Images).

Os Estados Unidos possuem o maior mercado de arte do mundo, em seguida a China e o Reino Unido, e portanto precisamos estar atentos com relação ao saque, o mercado negro de artes, e nossas responsabilidades éticas para com o nosso passado e conflitos presentes. Os saques e o comércio ilícito de antiguidades destroem a nossa habilidade de compreensão do passado e contribui com a marginalização das pessoas no presente ao redor do mundo.

O que você deve fazer se já estiver com a posse de possíveis antiguidades ou se você está inseguro quanto à sua proveniência? Se você herdou uma coleção de pontas de flecha que o seu avô desenterrou na fazenda, envie um e-mail para algum arqueólogo da universidade mais próxima, e ele poderá lhe informar se os achados encontrados na fazenda são arqueológicos, e como proceder. Mas se você possui artefatos de outro país sem uma documentação segura de antes de 1970, ou que foram importados após essa data, o meu melhor conselho é que você entre em contato com um avaliador responsável, ou advogado especializado com causas de artes, antiguidades ou patrimônio cultural. Eles estão melhor amparados por conselhos e soluções jurídicas nesses casos, do que os arqueólogos.

Para mais sobre o mercado negro de antiguidades, o New York Times possui publicações estelares na sua seção de Arte e Design, como: “The Curse of the Outcast Artifact,” “Germany Plans to Tighten Regulation of Art and Antiquities Trade,” e “Is the U.S. Protecting Foreign Artifacts? Don’t Ask.

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Kristina Killgrove é bioarqueóloga na University of West Florida. Para novidades sobre osteologia, a siga no Twitter (@DrKillgrove) ou curta sua página no Facebook Powered by Osteons

Traduzido por Daniela Ortega, fonte: Forbes

3 comentários

  1. Muito interessante, elucidativa e feita de maneira responsável… Precisamos mesmo reintegrar, continuamente, a discussão sobre a ética atrelada ao trabalho do arqueólogo e sobre a proteção do patrimônio. Que no texto é expandida além do foco artefactual. Muito boa mesmo, parabéns.

  2. Muito interessante, elucidativa e feita de maneira responsável… Precisamos mesmo reinterar, continuamente, a discussão sobre a ética atrelada ao trabalho do arqueólogo e sobre a proteção do patrimônio. Que no texto é expandida além do foco artefactual. Muito boa mesmo, parabéns.

  3. Ola, Eu encontrei uma mini estatua de busto na praia oceãnica onde eu moro no RJ, veio com uma onda, como posso saber se tem valor histórico ?

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