Usualmente quando se fala de esponja, pensamos ou no famoso Bob Esponja ou na esponja de lavar louça. Não é novidade para muita gente, inclusive graças ao Bob, que as esponjas são um tipo de animal marinho, assim como a estrela do mar, o polvo e o siri.
E inclusive, o fato de usarmos esponjas no banho e na pia vem justamente disso. Os gregos antigos usavam a esponja e seus corpos como ferramentas para banhos, graças à parte do seu esqueleto e suas proteínas que ajudavam a tirar o “grude”.
Apesar dessa fama, muitos destes animais ainda são desconhecidos ou tratados como desinteressantes por inúmeras pessoas. É um animal “simples” vamos dizer assim, sem cérebro, olhos, boca ou qualquer parte parecida conosco para que possamos nos identificar. Não por acaso é até comum alguns as confundirem com plantas.
Bem verdade, seu modo de vida, viver fixa no chão e filtrar a água do mar não as torna a mais aventureira ou incrível das criaturas. Mas é justamente o que se esconde dentro dela e como isso modifica o ambiente ao redor. As esponjas, por bombearem toneladas de água ao longo da sua vida criam regiões extremamente oxigenadas ao redor e seus poros as tornam locais adequados para muitos organismos viverem dentro delas.
Sim, parece estranho, mas existe uma verdadeira biota inteira dentro delas. Seja de minúsculos camarões, minhocas predadoras ou mesmo uma comunidade riquíssima de microrganismos. Sendo organismos tão antigos e ao mesmo tempo simples encucou inúmeros pesquisadores. Entretanto as aparências enganam: Seu estilo de vida, de filtrador fixo no substrato as torna alvos fáceis de predadores e ao mesmo tempo ferozes competidores por espaço contra corais, ostras, mariscos, cracas e outros animais que disputam o raro espaço.
Para tal, elas desenvolveram soluções bem complexas e engenhosas apelando para a guerra química!
Hoje inúmeros pesquisadores da química, bioquímica, biotecnologia, farmacologia e áreas afins buscam nestes animais novos compostos que podem nos ajudar a tratar ou mesmo curar doenças. As apostas são altas, mas as inúmeras evidências apontam que enquanto estes organismos não desenvolveram tanto organização celular ou um corpo mais complexo, tornaram-se especialistas na química. E toda essa especialização, aparentemente, começa com seu surgimento há 600 milhões de anos atrás, num momento da história que chamamos hoje de Ediacarano.
Vou ser franco com vocês, estimar a idade de origem de qualquer grupo de seres vivos é difícil. Seja usando dados moleculares dos organismos recentes ou os restos/vestígios fósseis. É possível que tenhamos sempre encontrado o fóssil mais antigo até o momento e tudo bem, a ciência não é onisciente e por isso também ela é maravilhosa, está sempre aprendendo mais.
Tendo isso em vista, podemos falar que o registro mais antigo até o momento são de materiais do Ediacarano (bege claro), logo antes do Cambriano (em verde musgo na tabela).
E desde então a diversidade de esponjas despontou! Esponjas massivas, em forma de vaso, ramificadas, em forma de crosta etc. Contudo, como sabemos destes registros, esponjas não tem muitos órgãos e são esponjosas, como elas deixam fósseis?
Um elemento comum à quase todos os grupos de esponjas atuais e fósseis são espículas! Estruturas bases que formam seu esqueleto. Como pequenas agulhas e cristais que são ligados por um conjunto de células e proteínas e que dão sustentação para o animal.
Estas espículas são extremamente características, algumas em forma de agulhas, outras com formas de uma bola com vários espinhos e outras sem uma forma muito bem definida. Estas estruturas podem se unir, intercruzar e ao final compõe algumas esponjas que podem ter mais de 2m de comprimento!
E apesar de tamanhos e formas incríveis, na maioria das vezes só estes restos microscópicos sobrevivem ao teste do tempo e se tornam fósseis. O que, apesar dos pesares, é muito legal e informativo. Pesquisadores brasileiros conseguem contar a história de variações ambientais em paleolagos e rios graças a estes restos de seres vivos. E sim, existem esponjas de água doce.
Em casos mais excepcionais algumas esponjas que viveram em ambientes ideais para preservação conseguiram ter seu corpo completamente preservado. E como portadores de poros ou poríferos, as esponjas são organismos, vamos assim dizer, permeáveis. As incrustações minerais e o processo de permineralização e substituição mineral fica facilitada.
Permineralização?
Sim, o processo em que os restos de um organismo poroso é preenchido por sedimento e minerais. É muito comum com vegetais e ossos, pode não parecer, mas ambos são porosos por dentro e conforme vão sendo enterrados, os minerais vão entrando em seus poros e a matéria orgânica vai se decompondo, deixando um molde quase perfeito dos restos dos organismos passados.
O mesmo acontece com algumas esponjas, onde os minerais ficam presos nos poros e a medida que a matéria orgânica vai sendo decomposta, o que resta é o molde do corpo do animal. Outra maneira de se preservarem é por meio da impressão de seus corpos, quando um soterramento episódico, por exemplo, um deslizamento de lama submarino cobre toda a região onde as esponjas vivem. O peso gradual do sedimento e a sua transformação em rocha permite a não decomposição dos restos gerando uma impressão do corpo do animal.
Então temos que eles deixam espículas, moldes permineralizados e impressões. Além disso, existe um último tipo de registro, muito particular, da família Clionaidae. Acontece que essa família se especializou em perfurar rochas, conchas, madeira e outros substratos duros para se proteger contra predadores. Então elas deixam escavações bem inusitadas nestes locais, sendo um dos poucos icnofósseis que as esponjas são conhecidas por.
Mas revisando aqui: Icnofósseis, moldes permineralizados, impressões e espículas. Apesar da diversidade do registro fossilífero a maior parte do registro é por meio das espículas e pior, elas não são abundantes e diversas (se compararmos com outros grupos). Então, apesar de imensamente informativos e diversos, o registro fossilífero destes animais acaba ficando desfalcado para nos ajudar a contar sua incrível história de quase 600 milhões de anos.
Mas não temam, dos diversos acasos na história da vida na terra, um grupo de esponjas desenvolveu mecanismos para acumular CaCO3 (famoso carbonato de cálcio, sim, o mesmo dos teus ossos, dentes, conchas de caracóis e ostras) em seus corpos. Essas esponjas foram primeiramente descritas nos anos 60 como um novo grupo, as Sclerospongiae. Scleros significa duro. Posteriormente, essa dureza foi descoberta como convergente, então elas são chamadas hoje de: Esponjas hipercalcificadoras.
Mas outros nomes já foram utilizados como: esponjas pétreas e coralíneas, não só por acumularem cálcio como corais, mas também por que no passado, muitas destas esponjas foram responsáveis por produzirem inúmeros recifes.
Durante o Paleozóico, estes animais, sobretudo o grupo dos estromatoporóides, foram responsáveis pela produção de grandes recifes, semelhante aos formados por corais atuais. Entretanto as extinções do final do Devoniano e as posteriores foram importantes em reduzir sua diversidade, sua abundância e o papel de construtores de recifes foi passado à outros organismos.
Ainda existem alguns poucos exemplares vivos atualmente, habitando buracos e cavernas de recifes de corais nos oceanos Índico, Pacífico e no Mar do Caribe. Bem, a história da Vida tem dessas, construtores superpoderosos de recifes no Devoniano para se esconderem em cavernas recifais.
A sua diversidade e o seu potencial de preservação podem ser interessantes quando pensamos em como isso pode ampliar e auxiliar no entendimento de um filo tão antigo e ao mesmo tempo tão inovador ao longo de milhares e milhões de anos.