Traduzido por Daniela Dias Ortega e Marcos Paulo Ramos
A descoberta de uma mandíbula de 2,8 milhões de anos apresenta o retorno de sua teoria! O famoso paleoantropólogo detalha à Sciences et Avenir o nascimento do gênero Homo em relação com o meio ambiente.
Entrevista por Rachel Mulot. Este texto foi publicado na Edição Especial “O que é o Homem? 100 cientistas respondem” nº 169. Nós reproduzimos este texto na ocasião da descoberta de um fóssil de mandíbula de 2,8 milhões de anos, o qual levanta a teoria do Evento (H)omo criado por Yves Coppens. Você também pode encontrar esta entrevista em vídeo no endereço que Yves Coppens nos deu nesta ocasião.
O gênero Homo surgiu como um tipo de resposta anatômica e biológica adaptativa à uma mudança climática. Um espasmo de fato abalou a terra há 3.300.000 anos, a aridez se estabeleceu na África tropical. A flora empobreceu, a fauna mudou; espécies – como os mastodontes e os hipparions – estão extintos, uns chegam e outros ainda tentam encontrar um lugar perante a crise. Esse é o caso dos elefantes, dos porcos, dos rinocerontes, que aumentaram a altura ou o comprimento dos seus dentes cujo desgaste tornou-se mais significante devido ao aumento do consumo de ervas. Os hominídeos, eles próprios, desenvolveram duas formas paralelas. Na África do Sul, apareceram grandes Australopithecus robustos, pelo meio de dissuasão, e poderosos dentes destinados ao consumo de vegetais duros e fibrosos. Enquanto que na África Oriental apareceram os Homo com o cérebro duas vezes maior que o de seus ancestrais Australopithecus e os dentes de onívoros. Havia de um lado uma estratégia física, e do outro uma estratégia intelectual.
Toda essa história, eu li nas camadas de fósseis do Vale do rio Omo, na Etiópia, onde eu trabalhava nos anos setenta. Eu era o único paleontólogo a me encontrar na presença de acumulação de sedimentos que permitiu uma leitura do que aconteceu entre 2 e 3 milhões de anos. Eu vi claramente que os hominídeos tinham sua própria resposta adaptativa. Eu nomeei esse episódio de Evento (H)omo.
Desde 1975, eu então havia proposto – timidamente – a ideia de que o homem, o gênero Homo, foi o produto de uma mudança climática. A ideia àquela época foi mal aceita. Não poderíamos admitir – tratava-se de algo inconsciente – que o homem pudesse ter reagido como os porcos, os elefantes, nem ter tido também lugar em seu ambiente, como os outros animais. Me acusaram de ser determinista. Finalmente, os anglo-saxões retornaram à ideia por sua própria conta uma década mais tarde. E desde então, a descoberta na Indonésia do pequeno Homem de Flores (Homo floresiensis), com o nanismo insular, confirmou que o homem é sensível ao seu ambiente. Hoje a evolução cultural ultrapassou a evolução biológica. Mas, nosso ambiente continua a nos modelar. Isso não é inofensivo, por isso o aumento dos nascimentos prematuros ligados à poluição ou o autismo que se instala entre as gerações mais jovens. Esta é uma fonte de reflexão.
Ao mesmo tempo que o crescimento do cérebro, apareceram por volta de 2,6 Ma, as pedras talhadas no segundo grau (uma primeira pedra era necessária para bater sobre outra). Nós jamais as encontramos associadas a outros animais além dos hominídeos, mesmo se os animais tenham utilizado as ferramentas de primeiro grau. A cada vez que alguém fala de traços suscetíveis de serem somente humanos (riso, vergonha, política etc.), outros dizem que estes também são percebidos – um pouco – entre os animais.
Os traços humanos – sentimentos, personalidades, reflexão etc. – não me parecem ser qualitativamente de natureza diferente daqueles dos primatas. Frequentemente, esses traços, nos homens, foram rapidamente desenvolvidos quantitativamente, e de uma maneira espetacular. A especificidade do homem, é a extravagância com a qual ele desenvolveu todas as suas qualidades, todo seu potencial cultural. Nada mais do que um gênio.
Fonte/Traduzido de: Sciences et Avenir