Quem foram os primeiros habitantes do Caribe?

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Largo da costa de Belize (Foto: Sébastien Perrot-Minnot)

Foi durante a última glaciação, que afetou o planeta por mais de 100.000 anos e acabou por volta de 11.000 anos atrás, que nossa espécie entrou na América.

Os dados arqueológicos, genéticos e paleoambientais mostram que os primeiros habitantes do continente Americano vieram a partir da Sibéria, se aproveitando da ponte de terras criada entre o nordeste da Ásia e o Alasca, pela queda no nível do mar. Contudo, as datas desta migração e da ocupação de vários sítios arqueológicos americanos da era glacial estão sujeitos a calorosos debates.

Se nos agarrarmos às datações que têm sido amplamente aceitas pela comunidade científica, os mais antigos remanescentes da atividade humana estão entre 15.000 e 16.000 anos; eles foram evidenciados nos Estados Unidos.

Durante o período Paleoíndio, o qual acabou por volta de 7.500 a.C., os humanos exploraram e colonizaram o Novo Mundo, desde a América do Norte até a America do Sul, e desde o Pacífico até o Atlântico.

Na América Central, o registro arqueológico atual vai até algo por volta de 13.000 anos. Ainda que a presença humana nesta região seja necessariamente anterior, pois é atestada em 14.600 anos, no Chile.

Podemos dizer que as sociedades Paleoíndias eram altamente móveis, deslocando-se por terra tanto quanto por mar (ao longo da costa). Seu legado material, o qual inclui trabalhos em rocha, osso, marfim e madeira, é indicativo de grupos com organizações familiares, clãnicas ou tribais, vivendo pela caça, pesca e coleta, porém, também se devotando a atividades artísticas e rituais.

A diversidade cultural deste grupos reflete, especialmente, nas admiráveis pontas  de projétil aparadas feitas de rocha.

Ponta Paleoíndia (Clovis) de August Pine Ridge (Belize), em exposição no Museu de Belize. Comprimento: 5,16 centímetros. Foto: Sébastien Perrot-Minnot.
Ponta Paleoíndia (Clovis) de August Pine Ridge (Belize), em exposição no Museu de Belize. Comprimento: 5,16 centímetros. Foto: Sébastien Perrot-Minnot.

Nas Antilhas (Caribenhas), até o momento, somente um único objeto Paleoíndio foi encontrado: uma ponta de projétil, coletada na superfície, em Trinidad.

Ainda que nós só consideremos os contextos arqueológicos escavados, as primeiras ocupações da ilha pertencem ao período Arcaico, o qual segue o Paleoíndio um; mais precisamente, eles têm sido datados entre 6.000 e 5.000 a. C.

Trinidad era, naquela época, ligada ao continente Sul americano, e nada sugere que seus habitantes da época tenham navegado para as ilhas localizadas ao norte.

No resto das Antilhas, os mais antigos vestígios foram evidenciados em Cuba, Porto Rico e Haiti, e datam entre 5500 e 4500 a. C.

Eles foram ligados à uma tradição heterogênea chamada “Casimiran”, que floresceu nas Grandes Antilhas e no norte das Pequenas Antilhas, até por volta de 2000 a.C.

Artefatos arcaicos do Haiti (A, B) e Cuba (C-F), feitos sobre macrolâminas. Fonte: Samuel M. Wilson, Harry B. Iceland and Thomas R. Hester, “Connections between Yucatan and the Caribbean”, Latin American Antiquity, vol. 9, n° 4, 1998.
Artefatos arcaicos do Haiti (A, B) e Cuba (C-F), feitos sobre macrolâminas. Fonte: Samuel M. Wilson, Harry B. Iceland and Thomas R. Hester, “Connections between Yucatan and the Caribbean”, Latin American Antiquity, vol. 9, n° 4, 1998.

As origens dessa tradição são discutíveis, porém, de acordo com a hipótese melhor argumentada, elas poderiam estar situadas em Belize. De fato, o objeto mais característico da indústria Casimiran também tem sido encontrado nos sítios arcaicos desse país: é uma macrolâmina, um tipo de lâmina de pedra com mais de 20 cm de comprimento, que não tem sido relatada em nenhum outro lugar entre os contextos arcaicos das Américas Central e do Sul.

As analogias são relativas à forma, mas, também às técnicas de manufatura, a frequência e o uso dos artefatos. Em certos casos, as macrolâminas foram retrabalhadas com o objetivo de produzirem ferramentas pontiagudas, o que permite fazer mais comparações, entre as Antilhas e Belize.

No entanto, essas similaridades não devem ocultar diferenças significativas. Nós notamos, assim, que as pontas de projétil arcaicas de Belize não possuem equivalente no arquipélago das Antilhas.

Macrolâminas arcaicas de Belize. Imagem: cortesia do Projeto Colha.
Macrolâminas arcaicas de Belize. Imagem: cortesia do Projeto Colha.

Como podemos interpretar esses dados?

Na América Central, o período Arcaico é caracterizado por um crescimento demográfico vigoroso, uma grande diversidade cultural e uma intensificação da exploração dos ambientes naturais, considerando que o aumento do nível do mar reduziu os territórios costeiros. Nós podemos supor que essa situação foi condutora para o desenvolvimento de conflitos.

A pressão social poderia ter empurrado grupos a se aventurarem nos mares caribenhos, na busca de novos horizontes.

Do norte da América Central, não é possível visualizar Cuba, mas os primeiros exploradores da ilha poderiam ter imaginado a sua presença olhando para as migrações dos pássaros ou os movimentos das nuvens.

Antes de alcançarem a costa de Cuba, eles tiveram que empreender uma jornada de canoa de três ou quatro dias, enfrentando as fortes correntes que atravessam o Canal de Yucatán.

Finalmente, eles descobriram uma terra cujos recursos eram certamente menos variados do que aqueles do continente, porém, ainda assim generosos.

Sobre esse assunto, o material disponível nas Antilhas e a adaptação a novos ambientes dificilmente podem explicar o abandono das pontas de projétil e as transformações da indústria lítica.

Essas evoluções mais poderiam revelar rupturas sociais e ideológicas, associadas com uma maior liberdade individual e a afirmação de novas identidades.

Sébastien Perrot-Minnot desenvolveu seu Doutorado em arqueologia. Ele é pesquisador associado à Universidade das Antilhas, na Martinica.

Fonte: caribjournal

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