Texto de K. Kris Hurt
Tradução de Marcos Paulo Ramos
Um geofato é uma peça de rocha que foi quebrada ou erodida naturalmente, ou seja, diferentemente daquelas que foram quebradas pela agência humana intencional. A palavra é aquilo que os linguistas chamam de ‘formação invertida’ (back formation) a partir da palavra artefato, evidentemente. Artefatos são produtos de comportamentos humanos, enquanto geofatos são produtos das forças naturais. Entre essas estão incluídas as forças naturais da erosão, turbações nas calhas dos rios, e pisoteio animal. Também é verdade que paisagens inteiras, como na foto abaixo, podem ser criadas pela natureza que nos engana ao nos fazer pensar que foram criadas por pessoas. Porém a maior parte dos estudos sobre geofato/artefato são focados na determinação se uma peça de rocha foi quebrada como resultado de uma produção lítica deliberada ou por forças da natureza.
Produção lítica e geofatos
A produção lítica, usando percutor duro ou percutor macio e/ou percussão por pressão para fraturar uma peça de matéria prima mineral e criar uma ferramenta de pedra possui um subproduto que é um dos mais frequentes tipos de artefato encontrados: lascas.
Lascas são todos os pequenos fragmentos de pedra criados durante a produção da ferramenta, e é o foco da maior parte dos estudos sobre geofatos/artefatos arqueológicos.
Determinar se lascas de pedra são artefatos ou geofatos é particularmente importante nos sítios realmente muito antigos, onde as implicações de uma má interpretação das rochas fraturadas como artefatos são realmente bem sérias. Como resultado, existem algumas poucas regras que os arqueólogos usam para separar os geofatos dos artefatos. Nesse sentido, o mais importante para a identificação de geofatos é a identificação de lascamentos sistemáticos – as características do trabalho humano.
Evidência de Geofatos
As principais técnicas analíticas ainda utilizadas hoje em dia são baseadas primeiramente nas características identificadas por Evan Peacock (1997):
Essas características incluem qualidades associadas com bulbos de percussão (uma protuberância criada quando uma rocha quebra sendo atingida por outra); o plano de percussão (o qual é criado pelo lascador para controlar o lascamento e facetado por subsequentes golpes), e a superfície dorsal (o lado oposto ao bulbo), a qual apresenta vários tipos de evidência de lascas que foram removidas. Leia algumas das indicações abaixo para obter uma maior compreensão sobre essas tecnologias.
Em geral seu artefato será provavelmente um geofato se dois ou mais dos seguintes itens forem válidos:
- Existem quatro ou menos negativos de lascas. Uma lasca é o que os arqueólogos chamam um pequeno fragmento de pedra quebrada de uma pedra maior. Um negativo de lascamento é uma cavidade feita sobre uma peça de rocha da qual um fragmento menor foi removido. Negativos de lascamento podem ocorrer naturalmente, quando rochas batem umas contra as outras em um escorregamento ou dentro de uma calha de rio, mas mais de quatro desses negativos já começam a parecer intencionais.
- Não há preparação do plano de percussão. O controle preciso do lascamento lítico é uma parte importante da feitura de ferramentas líticas. A evidência de que uma área achatada foi produzida sobre uma peça de rocha da qual foram retiradas lascas adicionais é certamente um indício de atividade humana.
- Os negativos de lascamento são “patinados” em taxas distintas. “Pátina” é o termo usado para descrever os efeitos de uma longa exposição aos eventos climáticos. Todas as superfícies expostas de uma rocha intocada deverão apresentar uma mesma “pátina”. Dependendo do clima e do tipo de rocha, leva vários séculos ou milênios para a “Pátina” se tornar aparente. Se uma rocha possui várias lascas removidas, e os negativos dos lascamentos são diferentemente patinados, você saberá que houve uma grande quantidade de tempo entre os eventos de lascamento, ou seja, dificilmente seriam humanos.
- Os negativos de lascamento ocorrem de forma randômica na rocha. Negativos de lascamento feitos por humanos nas rochas comumente serão padronizados, ao invés de randômicos.
Dicas de leitura:
- Museum of the Stone Age: Artefact or Geofact?
- About: Flint Knapping
- Austin RJ. 1999. Technological characterization of lithic waste-flake assemblages: Multivariate analysis of experimental and archaeological data. Lithic Technology 24(1):53-68.
- Bisson MS. 2001. Interview with a Neanderthal: an experimental approach for reconstructing scraper production rules, and their implications for imposed form in middle Palaeolithic tools.Cambridge Archaeological Journal 11(2):165-184.
- Bradbury AP, and Carr PJ. 1995. Flake typologies and alternative approaches: An experimental assessment. Lithic Technology 20(2):100-115.
- Bradbury AP, and Carr PJ. 2014. Non-metric continuum-based flake analysis. Lithic Technology39(1):20-38.
- Collins MB. 1994. Comprehensive lithic studies: Context, technology, style, attrition, breakage, use-wear, and organic residues. Lithic Technology 18(1&2):87-94.
- Cyrek K, and Sudol M. 2012. Artefacts or geofacts? Presenting a dilemma basing on the Early Vistulian finds from the Bisnik Cave, Poland. Anthropologie (Brno) 50(3):323-344.
- Gillespie JD, Tupakka S, and Cluney C. 2004. Distinguishing between naturally and culturally flaked cobbles: A test case from Alberta, Canada. Geoarchaeology 19(7):615-633.
- Lopinot NH, and Ray JH. 2007. Trampling Experiments in the Search for the Earliest Americans.American Antiquity 72(4):771-782.
- Lubinski PM, Terry K, and McCutcheon PT. 2014. Comparative methods for distinguishing flakes from geofacts: a case study from the Wenas Creek Mammoth site. Journal of Archaeological Science 52:308-320.
- Mercader J, Barton H, Gillespie J, Harris J, Kuhn S, Tyler R, and Boesch C. 2007. 4,300-Year-old chimpanzee sites and the origins of percussive stone technology. Proceedings of the National Academy of Sciences 104(9):3043-3048.
- Peacock E. 1991. Distinguishing between Artifacts and Geofacts: A Test Case from Eastern England. Journal of Field Archaeology 18(3):345-361.
- Pelcin AW. 1997. The formation of flakes: The role of platform thickness and exterior platform angle in the production of flake initiations and terminations. Journal of Archaeological Science24:1107-1113.
- Wallace IJ, and Shea JJ. 2006. Mobility patterns and core technologies in the Middle Paleolithic of the Levant. Journal of Archaeological Science 33:1293-1309.
- Wisniewski A, Badura J, Salamon T, and Lewandowski J. 2014. The alleged Early Palaeolithic artefacts are in reality geofacts: a revision of the site of Konczyce Wielkie 4 in the Moravian Gate, South Poland. Journal of Archaeological Science 52:189-203.