Por JuCa
Disponível gratuitamente em 2015, mas datado já de 2016, é o novo artigo sobre as análises tecnológicas de um sítio datado em mais de 11 mil anos, na região arqueológica de Serranópolis, Goiás (sim, o autor do artigo sou eu mesmo). Trata-se do famoso sítio arqueológico Gruta das Araras. O artigo foi publicado no periódico científico internacional Journal of Lithic Studies.
O sítio foi pesquisado pela primeira vez na década de 1970, pelo professor Dr. Pedro Ignácio Schmitz, que na ocasião classificou o sítio dentro da categoria de unidade cultural chamada Tradição Itaparica – trataria de uma categoria de sítios arqueológicos que apresentam um mesmo tipo de indústria lítica, no qual o artefato mais marcante é a “lesma” – que é basicamente um instrumento de pedra feito para raspar e é feito com lascamento em apenas um dos lados da peça (fica parecido com uma lesma mesmo, aquele molusco).
Este sítio arqueológico é, inclusive, aberto para o turismo. Lá no local você encontra uma pousada para se hospedar e guias para ´visitar os mais importantes sítios da região.
A análise dos vestígios líticos focou apenas o material datado em 11 mil anos, os vestígios relativamente mais antigos (encontrados em maior profundidade, porém não datados). O ponto principal desta pesquisa é que não existem muitas análises que foquem também nas lascas retiradas durante a produção do artefato. Antigamente, e as vezes até hoje, arqueólogos focam demasiadamente apenas nos artefatos. Esta pesquisa apontou as principais características tecnológicas desta indústria lítica.
De acordo com esta pesquisa, o sítio durante essa época era uma oficina lítica, ou seja, um local adotado especificamente para produção dos artefatos de pedra. Schmitz já havia chegado a esta mesma conclusão na década de 1970, uma vez que existem milhares de lascas residuais, retiradas durante a produção, e apenas sete artefatos de fato, sendo que alguns estão até quebrados.
Os resultados da análise serviram para reforçar a ideia de que as indústria lítica da denominada Tradição Itaparica tem como principal característica a produção intensiva destas lesmas. As lascas residuais possuem as mesmas características observadas nas marcas deixadas nos artefatos. A indústria lítica neste sítio foi caracterizada como uma produção de grandes lascas espessas, das quais são retiradas outras lasquinhas menores, porém de apenas de do lado de cima (de baixo apenas uma ou outra lasca que ajude a deixar este lado plano/reto), com gumes que possuem ângulos e formas apropriados para raspar diferentes objetos (como couro, ossos, vegetais, etc). Estas lesmas não são pensadas como artefatos para caça, mas principalmente para processamento de alimentos.
Outro fator interessante é que as características tecnológicas identificadas não se assemelham em nada com indústrias mais antigas do continente americano, como a famosa indústria de pontas Clovis da América do Norte (que até pouco tempo acreditavam ter sido a primeira cultura nativa do continente, e que teria originado as demais culturas arqueológicas americanas). Porém, não existe nenhuma evidência que relacione a Indústria do tipo Itaparica da indústria do tipo Clóvis. A indústria Itaparica surge em território Brasileiro durante a transição do Pleistoceno para o Holoceno como uma unidade cultural já bem definida, mas sem nenhuma evidência de suas possíveis origens até o momento.
Acesso livre ao artigo: Moreno de Sousa, J. C. 2016. Lithic technology of an Itaparica industry archaeological site: the Gruta das Araras rockshelter, Midwest Brazil. Journal of Lithic Studies. 3 (1). 20p.
[…] das Araras (GO), associada à Tradição Itaparica. A reportagem sobre este estudo está postada neste link. Desenho: […]
Parabéns, gostei do seu artigo.